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28abr17


Documento entregue pela delegação de povos indígenas Kanamary, Munduruku e Yanomami


À Missão Permanente do Governo Brasileiro para as Nações Unidas em Nova Iorque,

De acordo com as recomendações do Relatório da missão ao Brasil da Relatora Especial sobre os direitos dos povos indígenas, em consonância com o informe entregue à ONU por organizações indígenas e indigenistas no dia 31 de março de 2017 e com a Declaração do 14º Acampamento Terra Livre, do qual participaram mais de 4 mil indígenas, em Brasília, de 24 a 28 de abril de 2017, queremos fazer chegar ao Governo Brasileiro as seguintes considerações e exigências:

1. No que concerne ao direito à vida, contra a violência e a discriminação racial, muitos povos indígenas do Brasil vêm sendo assassinados por invasores de suas terras ou sofrem ameaças de madeireiros, garimpeiros, fazendeiros, grileiros, sem poderem contar com programas culturalmente apropriados de proteção a ameaçados ou com a punição dos assassinos. Lideranças Munduruku foram ameaças por um madeireiro dentro de seu próprio território, os Yanomami vivem sob ameaça dos garimpeiros invasores e os Guarani Kaiowa continuam sendo intimidados por pistoleiros e policiais. Denunciamos também o abuso e a violência com que foram tratados pela polícia legislativa os povos indígenas quando do exercício de seu direito à livre manifestação no acampamento Terra Livre, em Brasília, no dia 25 de abril de 2017.

Portanto, exigimos do Governo Brasileiro que assegure o acesso efetivo de todas as lideranças ameaçadas a um programa especial de proteção aos povos indígenas e que os policiais e servidores do Estado que cometem abuso de autoridade e violência sejam punidos.

2. Sobre os direitos territoriais, centenas de processos de demarcação de Terras Indígenas encontram-se paralisados e o Governo vem propondo diversas medidas administrativas e legislativas que representam enormes retrocessos ao direito originário à terra garantido na Constituição Federal de 1988. No caso do Tapajós, a Terra Indígena Sawre Muybu, ameaçada por empreendimentos hidrelétricos e minerários aguarda desde 28 de novembro de 2016 a assinatura da Portaria Declaratória pelo Ministro da Justiça e está sendo contestada por instituições governamentais, empresariais e entidades industriais com base na tese do Marco Temporal. Mesmo as Terras Indígenas já demarcadas são alvos de recorrentes invasões e não contam com a fiscalização dos órgãos competentes, como é o caso dos mais de 5000 garimpeiros que se instalaram no território Yanomami.

Portanto, exigimos do Governo Brasileiro o cancelamento definitivo das Propostas de Emenda Constitucional e revogação de todas as medidas legislativas ou administrativas que visam a alterar e impedir os processos demarcatórios (como a PEC 215, a Portaria MJ 80/2017).

Também exigimos a restrição do Marco Temporal apenas ao caso da TI Raposa Serra do Sol ou a autorizar exploração econômica de nossas terras (como a PEC 187/2016 e o PL 1610/1996). Exigimos o cumprimento do artigo 231 da CF 88 também no que tange ao usufruto exclusivo dos recursos naturais dos nossos territórios, a partir da implementação de políticas públicas de fiscalização territorial e proteção ambiental, como a PNGATI.

3. Sobre o acesso à justiça, há testemunho de que mesmo com as recorrentes denúncias de diversos povos indígenas (Yanomami, por exemplo) de invasões territoriais e ameaças, não são instaurados processos criminais e os exploradores não são punidos.

Portanto, exigimos que o judiciário seja também fiscalizado por um organismo específico em seus atos discriminatórios das populações indígenas.

4. Em relação ao direito à auto-determinação e ao consentimento livre, prévio e informado, medidas legislativas e administrativas, grandes obras e projetos de desenvolvimento continuam sendo concebidos e implementados sem a consulta aos povos indígenas, como se verifica, por exemplo, com a Reforma da Previdência, que impacta a aposentadoria rural da qual dependem muitas famílias indígenas. Como exemplos de projetos concebidos e discutidos pelo Governo sem consulta prévia dos povos indígenas estão Concessão Florestal no entrono da Terra Indígena Sawre Muybu, a hidrovia Teles Pires - Tapajós - Juruena.

Portanto, exigimos que os povos em isolamento voluntário, como os que se encontram no Vale do Javari e na TI Yanomami, sejam protegidos em seu direito de permanecerem a viver de suas próprias formas, conforme preveem os artigos artigo 5 e 231 da CF e que haja mecanismos jurídicos que garantam a fiscalização e penalização para o não cumprimento destes princípios constitucionais.

Ademais, exigimos respeito ao Protocolo Munduruku do Alto e Médio Tapajós, Waiãpi, Munduruku e Apiaká de Baixo Tapajós e a todos os Protocolos de Consulta que se venham a constituir, bem como a participação dos povos indígenas na definição de um projeto socioeconômico macro para suas regiões.

5. Em relação ao impacto dos grandes projetos, as medidas de reparação não estão sendo implementadas de forma apropriada, como se pode observar a partir do caso da hidrelétrica de Belo Monte, do complexo hidrelétrico do Rio Madeira, que afetou povos em isolamento voluntário, das Estações de Transbordo de Cargas em Itaituba que afetam territórios Munduruku e suas fontes alimentares, sem que haja nenhuma medida compensatória ou indenizatória.

Portanto, exigimos que o Governo siga cancelando grandes projetos com impactos irreversíveis aos povos indígenas, como o fez com o licenciamento da hidrelétrica de São Luiz do Tapajós, que cancele as pesquisas para projetos hidrelétricos no Tapajós e que indenizem todos os povos que tiveram seus direito violados e locais sagrados destruídos, como ocorreu com o povo Munduruku em Teles Pires e São Manuel, com medidas e indenizações definidas por eles mesmos.

6. Em relação à capacidade dos órgãos Governamentais, contrariamente ao recomendado pela relatora, testemunhamos o enfraquecimento da FUNAI e demais órgãos responsáveis pelos cumprimentos dos direitos e políticas indígenas. O fechamento de seis Frentes de Proteção de Povos Isolados, de Coordenações Técnicas Locais, como no caso de duas que atendiam povos da TI Yanomami e uma em Jacareacanga, bem como o estado de inoperância em que se encontram Coordenações Regionais como a de Itaituba (que atualmente conta com apenas cinco servidores dos 16 previstos), impedem que o órgão indigenista cumpra suas funções finalísticas.

Portanto, exigimos que seja garantido à FUNAI e à SESAI orçamento apropriado para que cumpra suas atividades finalísticas e que se revogue o decreto 9.010/2017.

Atenciosamente,

New York, 27 de abril de 2016

Povo Kanamary, Povo Munduruku, Povo Yanomami

[Fonte: Por Fernanda Moreira, Cimi Regional Norte II, de Nova York, Conselho Indigenista Missionário, Brasilia, 28abr17]

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